Lixo (quase) Zero

Camila Martins
5 min readJul 15, 2019

Em meio à imundície, pessoas tentam mudar pequenos hábitos diários para ajudar o meio ambiente. É o suficiente?

Por Camila Campache, Camila Martins e João Malafaia

Estamos afundando em lixo, sucumbindo à poluição, nos perdendo na sujeira. Não é exagero: em 2017 cada brasileiro produziu, em média, um quilo de lixo por dia e, a cada ano, são despejados aproximadamente 12,7 milhões de toneladas de plástico nos oceanos. Para tentar reverter ou desacelerar o quadro atual, algumas pessoas vêm adotando práticas diárias que reduzem a produção de lixo, apostando no movimento lixo zero como uma saída para esse caos ambiental.

Zero em termos. Ser lixo zero significa que, no seu dia a dia, você vai viver de maneira a produzir a menor quantidade possível de lixo, tendendo à não produção, e reaproveitando ao máximo o que, para uma pessoa de costumes casuais, iria ao descarte. O movimento começou com a francesa Bea Johnson, escritora do best-seller “Zero Waste Home” (Desperdício Zero). Aqui no Brasil a pioneira foi Cristal Muniz, designer de 27 anos que lançou o desafio de ficar um ano sem produzir nada de lixo, na tentativa de diminuir sua pegada ecológica.

A pegada ecológica refere-se ao cálculo da quantidade de recursos necessários do planeta para sustentar um modelo de vida. Ela leva em conta, a quantidade de água consumida, o espaço em hectares para produção de alimentos e o tempo de decomposição dos resíduos produzidos.

Medidas comumente adotadas por adeptos do movimento, como Bea e Carol, são: realizar a compostagem de restos de alimentos e outros compostos orgânicos e comprar em feiras e mercados de bairro, evitando as embalagens desnecessárias e dando preferência à venda local e a granel. Por parecer um objetivo difícil de ser alcançado, muitas pessoas participam parcialmente do movimento, mudando seus hábitos na maneira que conseguem, tendo uma vida de lixo quase zero.

Luana Gotardo é professora de inglês e, desde que se entende por gente, ela e a família evitam ao máximo produzir lixo desnecessariamente. “Antes de eu nascer meus pais moravam na Alemanha, e muitas medidas ecológicas e de consumo consciente são difundidas lá”, explica ela. “Esses hábitos continuam aqui no Brasil, sendo passados para mim e para o meu irmão.” No Brasil, mesmo que haja um culto às nossas florestas e natureza, não existe uma cultura de preocupação em torno da quantidade de lixo que produzimos e de como isso afeta o meio ambiente. De acordo com a Abrelpe (Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais), no ano de 2017 mais de 30% do lixo produzido foi para lixões a céu aberto ou aterros controlados, ao invés de aterros sanitários. Além disso, até o ano passado, mais de 1.600 municípios brasileiros ainda não possuíam nenhum incentivo à coleta seletiva.

Essa falta de preocupação com o lixo que produzimos está muito ligada à comodidade. “É bem mais fácil usar pratos e talheres descartáveis para não ter que lavar tudo depois, é muito mais barato comprar um pacote de macarrão e molho prontos do que fazer do zero em casa.” De acordo com Luana, essa perda de comodidade é o que faz o movimento lixo zero parecer inacessível. “É tão fácil e prático que a gente nem se pergunta se aquilo está fazendo mal ao mundo, ou quão nocivo é aquele pequeno ato”.

Cercado pelo tabu da inviabilidade, muitos acreditam que adotar hábitos que produzem menos lixo seja algo caro. Mas o que ocorre são investimentos a longo prazo, segundo a entrevistada. O propósito do movimento é gerar menos lixo, portanto as coisas compradas serão utilizadas de modo que sejam aproveitadas ao máximo e por muito tempo.

Com um esforço extra é possível adotar algumas medidas que já geram algum impacto. A partir de uma maior aceitação do movimento em si, mais pessoas estariam dispostas a adotar esse estilo de vida mais consciente. Deve ser levado em consideração que se mais pessoas levassem uma vida parcialmente lixo zero, o impacto no meio ambiente já seria positivo.

15 atitudes que você pode adotar para colaborar com o movimento:

  • Usar recipientes de vidro
  • Trocar as escovas de dente convencionais por escovas de bambu
  • Evitar máquinas de café com cápsulas e usar um coador, se possível de pano
  • Adotar o uso de buchas vegetais para o banho
  • Sempre andar com bolsa retornável
  • Comprar comida a granel, em feiras ou mercados de bairro
  • Fazer compostagem
  • Construir sua própria horta
  • Andar sempre com uma garrafa térmica
  • Trocar os absorventes por calcinhas absorventes, coletores ou absorventes de pano
  • Substituir produtos de higiene, limpeza e cosméticos por alternativas caseiras
  • Utilizar dos aparatos tecnológicos para anotar as coisas, ao invés do uso de papel
  • Dar preferência para as empresas que possuam a iniciativa das embalagens retornáveis
  • Se o lixo for produzido, procurar lugares onde o descarte possa ser feito da maneira correta
  • Encontrar uma função para as embalagens que você compra

A estudante de medicina, Tainá Vilela, faz o possível para produzir a menor quantia de lixo possível. Ela conta que, assim que entrou no mundo do veganismo, passou a prestar mais atenção nas consequências que suas atitudes possuíam no meio ambiente. Suas primeiras práticas relacionadas ao movimento foram simples, mas eficientes: “Comecei a evitar comidas empacotadas, sucos de caixinha, industrializados em geral. Além de colocar as verduras que comprava em bolsas de pano”, conta a jovem, “a redução na quantidade de embalagens no lixo de casa foi bem perceptível”,

Apesar de todo o esforço para a diminuição do lixo, existem momentos em que não há como evitá-los, como saquinhos para recolher as fezes de animais e papel higiênico, além do lixo que você acaba recebendo, em embrulhos de presentes, por exemplo. “para driblar isso, eu sempre reciclo o que rasgou, e reutilizo o embrulho quando for dar um presente para alguém.Já tem uns 5 anos que eu não compro embalagens ou embrulhados por guardar e reutilizar o que eu ganho”, conta Luana.

O ecólogo Alberto Peret acredita que não é possível tratar o lixo zero como apenas uma questão ambiental, mas é sobretudo social. Ele argumenta que, ao observar as encostas de uma favela é possível ver como o lixo lá é tratado. Não por culpa dos moradores, mas simplesmente por falta do Estado. “Não há saneamento básico, Não há escola, não há assistência mínima do governo. Será que o lixo ali é o problema?”.

Este não é um problema difícil de ser resolvido, argumenta a jornalista ambiental Paulina Chamorro. E completa dizendo que é um problema de mudança de atitude, de comportamento e da falta de responsabilização de empresas. A solução, entretanto, depende de uma boa vontade política.

Ela também lembra que, para o objetivo do movimento Lixo Zero ser atingido, é necessária a ação de todas as partes. “O lixo é um problema que deve ser tratado no município, na cidade, no Estado”, explica ela, “cabe primeiramente ao consumidor mudar seus hábitos rotineiros, assim como cabe às empresas assumirem responsabilidade por aquilo que produzem e também ao governo fiscalizar as leis ambientais.”

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Camila Martins

Estudante de jornalismo, amante de fotografia e entusiasta da moda